quarta-feira, 8 de agosto de 2018

Cattani, Corrado Cattani. Este nome diz-vos alguma coisa?
A mim lembra-me a música do genérico e o facto de o meu pai me mandar para a cama numa das últimas séries protagonizadas por Michele Placido.
Lembro-me da surpresa geral com a morte da personagem principal e de acompanhar algumas temporadas posteriores de O Polvo, em casa da avó materna, nos anos 90, salvo erro nas noites de segunda-feira.
Há uns anos comprei algumas das séries a preço da uva mijona, vi um ou outro episódio da primeira temporada e pronto, quedei-me por ali. Há pouco mais de um mês voltei à carga, revi o primeiro episódio, a tentar cativar a esposa para o visionamento, sem sucesso já agora, e fui vendo os 6 episódios. Sem pressas.
Em primeiro lugar, é mais fácil um filme/série de tv dos anos 1970 envelhecer melhor do que um filme/série de tv dos anos 80. As roupas, os penteados atingem dimensões burlescas; o maior problema com a primeira temporada de O Polvo nem é esse, mas a péssima qualidade da imagem. Mas se passarmos por cima destes pormenores estéticos históricos e técnicos, O Polvo continua a ser uma excelente série de televisão, muito bem escrita e interpretada. Os maneirismos interpretativos não serão os americanos, a que estamos mais habituados, haverá até algumas práticas de realização típicas da época (os planos parados iniciais, por exemplo) que nos poderão fazer alguma urticária; mas pensar que a televisão pública italiana tinha esta maturidade há 35 anos, faz-me pensar. Nós fizemos o quê?
O Polvo conta a história do Comissário Cattani que, a braços com a tentativa de salvar o seu casamento, é enviado para a Sicília, onde investiga a morte de um outro Comissário pela máfia.
A passar por problemas conjugais, Cattani começa a mexer com o status quo e impunidade a que os mafiosos estão habituados e cedo se torna o alvo destes.
Fugindo a alguns lugares comuns, a primeira temporada consegue ambientar-nos na modorra moral, política e mafiosa da Sicília, mas também da sociedade italiana, no geral. O idealismo do Comissário esbarra na estrutura mental, social, política, mediática, temerosa e cobarde da comunidade onde se insere. A violência física, mas também psicológica, torna-se uma presença habitual, os últimos episódios mexeram com a minha bílis, pela naturalidade com que o mal é encarado, praticado e desculpado.
A pequena criminalidade, o escopo vai-se alargando nas temporadas seguintes, o flagelo da droga, as pequenas, mas consistentes, vozes de oposição à violência mafiosa completam o quadro de uma série que cresce ao longo dos episódios e que termina num tom acre e cinzento. Realista, portanto, se tivermos em conta o dia a dia siciliano nessa altura.

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